terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Dos Preparativos do Debate “Virtual” sobre o Estado da Nação Blogueira

Já passam das oito da manhã de Segunda Feira e há muita gente atrasada, e Lay Lobo, um dos membros da organização, reclama, pois é que, exceptuando Mnininha d’Soncent que já tinha anunciado a sua chegada com um relativo atraso e em retalhos, o resto do pessoal prometera a sua presença a horas. Es debi sta la na Jonh White ta bebi um café margós, di gozo – diz o Presidente da Ala Marginal. O Baluka Brazão, outro membro da organização, com os seus botões: "minis k'á ta sumara tempo".

Da ordem do dia constam temas quentes:

a) Praia: lixo e insegurança, proposto entusiasticamente por Pedrabika, com o apoio expresso do Ziquizira. Gentes De olho na Praia e interessada em ver Outra Praia prometem participar activamente no debate. No entanto, no período antes da ordem do dia, será prestada uma homenagem póstuma ao Lantuna, durante a qual o Albatrozberdiano recitará em conformidade, tendo como música de fundo um Son di Santiagu;
b) utilização do K e a ausênsia do no Krioulo (ou Kaboverdiano, komo keiram), kom os pontos frakos e fortes do Alupek a estarem em sima da mesa.

Os repórteres do Jornal da Hiena estão já a postos para registar os Momentos do Dia que Passa, e que não contará com a presença do Kizó Oliveira, que já tinha anunciado não tomar parte nesta sessão apelidada por ele de “mérdia”.

Não faltarão representações locais, internacionais, das minorias e da classe feminina. Zemas (Tarrafal de Santiago); Pontxa Patxe Parloa (São Nicolau); Benvindo Sinta10 (Santo Antão) e Soncent prometem levantar a voz a favor do reforço da descentralização virtual. Por sua vez, Zé Lino será o interlocutor das preocupações dos Ciganos. A mulher cabo-verdiana far-se-á ouvir por mais igualdade na diferença com a Amante da Rosa, que prometeu perfumar a sala; a Vdmaktub; a Cena Kritika e a Sopafla. De terras lusas viajaram Paló e Digreja

Quando todo o mundo sair do encontro, levará certamente consigo um bilhete do espectáculo “Son di Virason” do Kaká Barbosa e um convite para tomar parte em mais uma caminhada promovida pelo Paulino Dias.

Ah… ia me esquecendo!!! Na galeria estarão olhares anónimos, dentre os quais os do Da Caps, que promete incomplacência para com pseudismos.


(Sob o efeito de “Da kel bom d'Sintonton”, Ribeira Grande (puvuossom), 29-01-2008.)

Praia: da Pluriculturalidade à multi/interculturalidade

Sinto saudades assim que ponho os pés fora da Praia, mesmo que seja ao interior da Ilha de Santiago. Parafraseando Tony Lima (Kaoguiamo), Praia krê ê ka limpu (para os mais maldosos: limpo, mas no sentido ligado à bruxaria) . Mas do que é que tenho eu saudades para além, como é óbvio, dos meus mais próximos?

César Schofield, ao comentar para o telejornal da TCV a sua mais recente exposição, mencionou que, apesar do carácter feio da estrutura física da cidade, esta é no entanto bonita do ponto de vista da diversidade cultural, havendo gentes e comunidades oriundas de diversas paragens, nacionais e internacionais. É disto que sinto saudades: a pluralidade cultural da Praia, onde estão comunidades de todas as outras da ilhas e do interior da ilha de Santiago; dos africanos continentais e/ou lusófonos; dos latino-americanos; dos asiáticos; dos europeus…

Devo, no entanto, admitir que, independentemente de ter os pés dentro ou fora da Capital, sinto mais saudades ainda de uma Praia multi/intercultural. É que apesar da diversidade cultural, não parece haver uma interacção ou interpenetração dessa plêiade de culturas e de especificidades locais e regionais. Muitas não se conhecem ou não se reconhecem.

Eu imagino uma Praia onde cada mês é dedicado a actividades relacionadas a uma dessas comunidades (por exemplo, mês da ilha do Maio, da ilha de Santiago, da comunidade asiática ou oeste-africana ,etc, etc), período ao longo do qual as autoridades centrais ou locais, por um lado, promovem actividades que retratam as gentes dessas comunidades e suas especifidades culturais e, por um outro, estimulam o sector privado a fazer o mesmo: restaurantes a realizarem noites culturais dedicadas à comunidade do mês com pratos típicos e música local; rádios privadas a difundirem programas respeitantes à comunidade do mês, etc.

A meu ver, isto iria certamente diminuir as tensões sociais e o sentimento de exclusão sócio-cultural que possam existir e redinamizar (ou “revolucionar” até) a vida sócio-cultural da cidade.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

"All Excluded"

Sempre que o assunto é inclusão ou exclusão, seja ela económica, política, social ou cultural, recordo-me da fantasiosa versão da origem do Forró - denominação do género musical originário da região Norte-Nordeste do Brasil cujo ritmo frenético constitui a característica mais marcante - segundo a qual esse termo deriva do inglês “For All” (para todos), que era o nome dado a bailes realizados por soldados americanos baseados na Cidade de Natal (Estado do Rio Grande do Norte), na época da IIª Guerra Mundial. Conta-se que, apesar do nome “For All”, aqueles bailes eram interditos aos locais, pelo que estes, em contrapartida, resolvem fazer também o seu Forró.

Baluka Brazão, no seu post sobre o Turismo Barato na Ilha do Sal, fez uma breve análise do impacto negativo da modalidade “All Included”, praticada por estabelecimentos turísticos da ilha, na vida das comunidades locais. O caso do Sal aplica-se também ao da Boa Vista, onde cada vez mais as populações locais parecem estar excluídas dos “ganhos” do nosso modelo de desenvolvimento turístico. Há dias, a correspondente local do interessante programa “Pulsar Informativo” da RCV disse que há alguma frustração por parte dos locais que pensavam que a abertura do Aeroporto Internacional iria dinamizar a vida micro-económica da ilha, mas que, afinal de contas, muito por culpa do All Included, não tem sido assim. Por um lado, enquanto consumidores, além de se verem a braços com um custo de vida cada vez mais elevado, às vezes, os locais nem sequer chegam a ter acesso a determinados produtos, como é o caso dos peixes que costumam faltar porque o que existe (capturado ou desembarcado) é quase que totalmente direccionado para os hotéis. Por outro lado, enquanto produtores de bens e prestadores de serviços, os mesmos têm cada vez menos oportunidades de gerar rendimentos porque já está tudo incluído.

A continuar assim, só restará a essas populações esperar que os nem sempre evidentes ganhos a nível macro do turismo sol-e-praia sejam distribuídos de forma equitativa pelo Estado e que não sirvam para reforçar as desigualdades e disparidades locais e regionais.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Tudo em Casa

Duas coisas motivaram-me a fazer este post: em primeiro lugar, a curiosidade dos álbuns do Zeca e do Zézé di Nha Reinalda (Na Caminhu e Dokumentu, respectivamente) – tios – e do Vadú (Dixi Rubera) – sobrinho- terem sido lançados um atrás do outro, prova mais do que suficiente da vitalidade da veia artística desta família. Em segundo lugar, o facto destes álbuns, até onde eu sei, não terem sido alvo de apreciação na nossa blogosfera.

Na CaminhoZeca di Nha Reinalda

Já não era sem tempo! Isto é o que me apetece dizer sobre este trabalho do Zeca, pois este colosso da música nacional, que esteve recentemente entre a vida e a morte, brinda-nos com um álbum mais maduro, não virado somente para o puro entretenimento, como é caso dos seus anteriores trabalhos a solo. Por outras palavras, ele largou o mundo da vertente electrónica e voltou ao do electro-acústico, reunindo músicas com forma e conteúdo, do próprio e de outros compositores, a saber, Tey Barbosa, Katchás, Ney Fernandes, Zekinha Magra, Djinho Barbosa, Tony Rasta e Codé di Dona. O que me chamou particular atenção foi o número bastante significativo de Versões lentas do Funaná, o que a meu ver contribui para mudar um pouco aquela ideia de associar este género musical à dança ou ao puro entretenimento, ou se quiserem, à pura barulhada.

DokumentuZézé di Nha Reinalda

Quem bem me conhece, sabe o quanto eu aprecio o Zezé di Nha Reinalda. Por acaso, eu já tive a oportunidade de colocar aqui no Djaroz, uma interpretação minha do Teris ê ka Pexi, uma composição do Zezé, que o mesmo interpretou no Álbum Onti y Oji (1988). Ao ouvir alguns temas do Dokumentu, voltei a sentir saudades do Zezé dos Anos 80.

Curiosamente, ele resolveu abraçar o mundo da música electrónica justamente no momento que seu irmão, o Zeca, resolveu fazer o inverso. Penso que terá sido uma opção arriscada, pois já ouvi vários admiradores deste compositor comentar que prefeririam ver o Zezé electroacústico a que estão acostumados. Eu, particularmente, não tenho nada contra essa opção, no entanto, nas faixas que tive oportunidade de apreciar, considero que o Zezé - que tem provas dadas de que sabe cantar, contrariamente ao que muitos dizem injustamente por não gostarem do seu timbre de voz – manifesta um excesso de zelo em ornamentar as melodias e arriscando muito em variações de altura da voz.

Uma outra consideração é sobre as letras. Lembro-me de certa vez ouvir alguém dizer que as composições do Blik Txutxi não são arte, mas sim desabafos. Parece-me, e quero estar errado, que o Zezé tem estado sob um efeito negativo de ressentimentos, o que estampa um carácter sombrio às suas criações mais recentes.

De todo o modo, como reza aquele ditado Guineense, o erro não invalida o esforço desenvolvido. Espero, no entanto, estarmos errados - eu e outros apreciadores das criações do Zezé - nas nossas considerações e mudarmos de opinião ao acostumarmo-nos com o Dokumentu, sucedendo o mesmo que em relação ao Guentis d’Azágua que, conforme o Zezé disse ao Jornal A Semana (edição de 11 de Janeiro último), tivera também uma recepção pouco calorosa nos primeiros tempos do seu lançamento, mas que depois acabou por se tornar no sucesso que todos nós sabemos. Oxalá assim seja.

Dixi Rubera – Vadú

O Dixi Rubera é um álbum ousado, uma vez que há quase um rompimento com a linha de arranjos do anterior trabalho, tendo o Hernâni Almeida, com a mestria que lhe é peculiar, ido buscar ao Rock N’Roll e ao Blues elementos para vernizar as composições terra terra do Vadú, estas sim, sempre naquela linha de resgate de vivências rurais e rurbanas.

Este é também um álbum para ouvir com calma, e ainda bem que é assim, pois não se trata de um descartável, e com prazo de validade. Constitui uma oportunidade entender nesta obra a forma descomplexada como o Hernâni, o Vadú, o Mikau e a expertise sonora do Zunga deram corpo a criações que rompem amarras de tradicionalismos convencionais e abraçam a universalidade (e não globanalização!) do som.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Como Vejo Cabral Hoje

Eu pretendia abrir esta rubrica “datas” na semana passada com o 13 de Janeiro. Mas como fui antecipado pelo Post “politicamente incorrecto” do Abraão Vicente, que, igual a si próprio, atirou para tudo quanto é lado, preferi navegar em águas menos turbulentas do 20 de Janeiro.

Por ocasião de mais um aniversário da morte de Amílcar Cabral, gostaria de discorrer sobre esta figura ímpar da nossa história. Passados 35 anos do seu assassinato, ele continua a merecer a atenção de estudiosos, analistas, dirigentes e intelectuais preocupados em esmiuçar ou aprofundar o já vasto manancial de informações sobre a sua vida e seus feitos. Este post sobre Cabral gira em torno da seguinte questão: O que podemos aprender do exemplo de Cabral nos dias que correm?

Sem vestir farda pré-pronta de militarismo algum, para mim, e penso que para muitos, Cabral é e continuará a ser um exemplo de luta por um ideal de libertação. É bom lembrar que Cabral, quando jovem, pese embora o regime de então, tinha acesso a oportunidades, tanto é que conseguiu - com algum sacrifício é certo – estudar e seguir para Portugal a fim de prosseguir os seus estudos e alcançar uma formação superior. Ele poderia, entretanto, ter permanecido tranquilo no seu canto e usufruído das oportunidades que tinha dentro do regime em vigor naquela época. Mas não. Movido pela sua consciência cívica, desenvolveu uma estratégia de transformação do mundo que o circundava e que, segundo ele e os demais que abraçaram aquela causa, era a mais eficiente e eficaz para a época. O uso da cultura para gerar uma força colectiva grande, sob o signo da unidade nacional, e encarar os sacrifícios da luta armada teve um contributo inestimável para o processo da Independência da Cabo Verde e da Guiné Bissau.

Portanto, numa altura em que parecemos viver uma crise de consciência cívica, é bom sempre lembrar o exemplo dado por Cabral. Se nós, os que têm acesso a mais e melhores oportunidades criadas pelo crescimento económico, fecharmo-nos nos nossos bunkers e mantivermos a nossa apatia cívica ante as desigualdades e exclusões geradas por esse mesmo crescimento, a violência e a sensação de insegurança continuarão a fazer primeiras páginas dos nossos jornais.

Palmas: Tarrafal de Santiago

Segundo as autoridades, não houve registo de ocorrências policiais e ninguém que participou nas festividades de Nhu Santo Amaro deu entrada nas instalações sanitárias daquele concelho em decorrência de actos de violência. Quem dera que fosse sempre assim em todos os eventos do género realizados em outros pontos do território nacional.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Ao Kaká Barboza: Em Jeito de Apreciação-Reacção... (a Post..Eriori...)

Caro Kaká,

Preparava eu, na tarde noite de ontem, para escrever um Post em uma espécie de apreciação-reacção ao teu bilhete quando, de repente, a Electra .... (o resto já sabes). Sendo assim, resolvi ligar a rádio do telemóvel e sintonizar a Rádio Nacional (RCV). Durante quase duas horas, ouvi músicas de qualidade, nossas e dos outros, a maior parte em formato electro-acústico. Pus-me a pensar: talvez eu tenha tido a sorte de testemunhar um momento raro ou então isto aconteceu porque, como justificarias, era de noitinha. Mas também pus a mim mesmo a questão: será que estou desactualizado e não percebi que a Rádio Nacional está a disponibilizar mais espaço para as músicas feitas por nós, e pelos outros, em formato electro-acústico (as mornas, a maior parte das coladeiras, um número razoável de funanás e batucos, “Dor” do Gil Semedo, o último CD do Gylito, alguns sembas, marrabentas, gumbés, etc,etc), depois que apareceu a versão Teen, a RCV+?

Sabes, Kaká, eu até entendo que as rádios comerciais sejam espaços onde os DJs aproveitam para mostrar que fazem melhor mixagem que os DJs da Concorrência e assim garantirem não só maior audiência na sua rádio, mas também mais biscates nas discotecas, afinal de contas, esta é a lógica deste tipo de mercado. Compreendo também que os DJs acreditem que o são só por saberem manejar os softwares e hardwares de mixagem e que, em termos de música, pensem que o importante mesmo é o Beat (ou a batida), pois falta-lhes alguma orientação mais aprofundada em harmonização.

No entanto, já se tratando da Rádio Nacional, que sempre teve, até onde eu sei, Técnicos de Som e não DJs, eu sempre espero algo mais, isto é, mais diversidade, mais “democracia” musical, mais equilíbrio entre o electro-acústico e o electrónico. Prometo-te que vou estar atento nestes dias à Rádio de Todos Nós para ver se dissipo estas dúvidas criadas pela noite escura de ontem.

Um Abraço.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

“BRUMA SECA” E A AVENTURA SANTANTONENSE


Bruma Seca: Ulysses, Arlindo, Tey, Eu e o Nhelas


Já vai completar um ano que o Bruma Seca - assim entendeu Tey Barbosa chamar àquele agrupamento musical de circunstância - passou dias inesquecíveis por terras santantonenses. A convite da Câmara Municipal da Ribeira Grande, por intermédio do Arlindo (na foto), tocámos no Polivalente da Ponta do Sol, por ocasião das festividades do dia daquele Município (17 de Janeiro). A princípio, devíamos servir de grupo suporte ao Tcheka, mas como ele acabou por não viajar, assumimos as rédeas da situação. Tivemos também a oportunidade de apresentar algumas músicas num jantar oferecido pela Câmara Municipal na localidade de Ribeirão.

Mas o mais excitante da nossa estada ficou por conta dos momentos que vivemos em Ribeira da Torre, especialmente, com aquele cóld d’peixe no Tanque de Boca d’Fund e o concerto improvisado no Bar do Boi, que este achou por bem registar em CD e enviar-nos posteriormente.

De facto, nas crónicas sobre a sua Terra Natal, Paulino Dias não exagera ao referir-se à beleza da paisagem local, mas também, e em especial, à das suas gentes.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Palmas para o Stieve Andrade e seu Programa!

Foto: sondisantiagu.blogspot.com

Esta segunda edição da rubrica “Palmas” (que resolvi criar de uma hora para a outra) vai para o Stieve Andrade e seu Programa “Secção da Música” (na Rádio Comercial, aos sábados, às 10 da manhã).

Este invisual, que de cego não tem nada, tem proporcionado a vários artistas, principalmente os músicos, a possibilidade de promoverem o seu trabalho. Constitui igualmente uma oportunidade para os ouvintes estarem a par das novidades da nossa música, especialmente as feitas no formato electro-acústico.

Evidentemente, que se pode criticar a permeabilidade do programa, cujo único afunilamento (que chega a ser suave) parece residir nesse contraponto entre o electro-acústico e o electrónico . Mas eu penso que é justamente isso que constitui o sal do Programa: os artistas sentem-se à vontade porque sabem que vão para lá não para estar sob o crivo da crítica voraz, mas sim para promover o seu trabalho. Este facto acaba por fazer com que os artistas se sintam à vontade até para expor partes dos bastidores e dar-nos a conhecer elementos humanos, humanistas, ou humanizantes que concorreram para a feitura da sua obra.

Entretanto, o Stieve está magoado. No passado dia 8 de Dezembro, por altura do 6º aniversário do Programa, ele viu gorada a ideia de organizar algumas actividades de comemoração, devido à quase total indisponibilidade dos artistas (especialmente, os músicos) que, no entanto, já tiveram a oportunidade de promover seu trabalho no programa.

Lembro-me dele ter abertamente manifestado, naquela edição do Programa, a sua decepção com a classe artística nacional residente, especialmente os que ele tinha abordado. Nem mesmo o facto do Dany Spinola e do Tó Alves terem ido lá, assim como o Djinho Barbosa (este para encerrar a edição daquele dia) e do Mário Lúcio ter telefonado, prontificando-se a oferecer dez exemplares do Badyo para o Stieve oferecer aos ouvintes do programa, chegou para sanar a dor que lhe ia (e ainda lhe vai!) na alma.

Confesso que eu, mesmo não tendo sido visado directamente, senti-me envergonhado por essa postura nada dignificante dos que foram abordados e se mostraram indisponíveis, sem terem, todavia, apresentado uma justificação suficientemente convincente.

De qualquer modo, acredito que este momento triste não vai frenar o entusiasmo e a motivação com que todos os sábados ele conduz o seu programa.

Força Stieve!!

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Proposta nº4 : Uma Divisão Diferente para a Música Feita por Nós

A divisão mais comum para os diversos estilos de música, nossos ou não, em cima dos quais produzimos, opõe o grupo do tradicional, constituído pelos nossos géneros musicais, ao do comercial, constituído pelo Zouk Love, Kuduru, Ragga, Soukouss, Rabadop, Rap, etc.

O primeiro problema dessa divisão prende-se com a noção de comercial. Será que o carácter comercial não se encontra em todos os estilos, sejam eles tradicionais ou não? Evidentemente, que se pode argumentar que os estilos como o Zouk Love ou o Kuduru são de consumo rápido e que não têm nenhum outro carácter que não o do puro entretenimento. Mas penso que isto não é suficiente para o separar das águas. É bom lembrar que as carreiras de artistas como Tcheka, Cesária Évora ou Mayra Andrade são conduzidos sob uma óptica comercial muito forte, o que acaba por reflectir-se nos álbuns produzidos (Tcheka a ser produzido por Lenine; Cesária Évora a cantar em Espanhol; Mayra a cantar em francês, etc, etc). Tudo isto é comercial, também!

Um segundo aspecto tem a ver com a definição de tradicional. Quando se houve um Tó Alves, Dudu Araújo ou Bius não se tem dúvida que se está perante algo tradicional, naquela acepção da palavra ligada ao que é nosso, isto é, sente-se uma presença forte de elementos genuínos de géneros musicais nossos, independentemente de haver aqui e ali alguns elementos de outras paragens. Mas o que faz o Tcheka é mesmo batuco? As músicas do Dany Silva ou do Vlú devem ser rotuladas de tradicional? O que são aquelas composições de Renato Cardoso interpretadas pelos Tubarões? Enfim, poder-se-ia desfilar ainda enésimos exemplos de canções ou de artistas que criam grandes dificuldades de enquadramento na clássica divisão entre tradicional e comercial.

A mim me parece que poder-se-ia resolver boa parte destes problemas se, ao invés da divisão tradicional-comercial, fosse feita uma outra, com base no formato (não estou a ver outro termo) da execução ou da produção, isto é, numa divisão entre Música electro-acústica e Música electrónica.

A música electro-acústica englobaria todos os estilos e géneros musicais (genuinamente nossos ou não) executados por instrumentos eléctricos, acústicos ou electro-acústicos. Por outras palavras, músicas em que o som de guitarra é mesmo de guitarra e não de teclado; o som do saxofone é mesmo de saxofone e não de teclado. Alguém deve estar a perguntar se não haverá Zouks que possam se enquadrar aqui também . Evidentemente. O “I’m a Professional” do Orlando Pantera é um deles.

Quanto à música electrónica, teríamos as feitas normalmente por um teclado profissional ou por um software musical através do Sistema MIDI, complementado por captações de Áudio nos estúdios de gravação; com efeitos para tudo quanto é lado e com adaptações e “correcções” para que tudo saia na perfeição. Os instrumentos acústicos aí não têm vez nem voz (aquele barulhinho da guitarra nylon aí não passa!!!) e os eléctricos podem até ter espaço, mas muito reduzido. Na verdade, o teclado trata de fazer (bem ou mal) tudo o que os outros instrumentos fazem. Muitas coladeiras que ouvimos hoje passariam, de certeza, a fazer parte deste grupo.

A divisão vista nesta perspectiva permite até corrigir algumas análises e julgamentos injustos para com algumas produções. Por exemplo, albuns como “Unidade e Amor” dos Rabelados, “Rapazis Nobus” dos Livity, os primeiros álbuns a solo do Grace Évora e do Splash, que não são estilos genuinamente tradicionais nossos, mas que têm uma componente humana muito forte traduzida na execução dos instrumentos, contrariamente ao Cabo Zouk Love que hoje conhecemos.

Enfim, penso que a nossa maior luta não é contra a estrangeirização dos nossos géneros musicais, mas sim contra a desumanização da produção musical e a consequente minagem da acção colectiva no domínio da criação e execução musicais.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Curiosidades da "Superinteressante"

Passei uma vista de olhos por algumas edições da “Superinteressante” (revista brasileira de curiosidades), que de resto tem um link aqui do lado direito, e encontrei algumas preciosidades que aproveito para partilhar convosco:

  1. Porque o dia acaba com feira (segunda-feira, terça-feira,...)? Saibam aqui
  2. Como surgiu a expressão “do arco-da-velha”? Leiam aqui
  3. Como surgiu a expressão “tortura chinesa”? Cliquem para saber
  4. Porque os homens escoceses usam saias? Vejam a resposta

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Mais Música Minha no Djaroz

Resolvi colocar mais três canções minhas no Djaroz, executadas a voz e violão e gravadas por Jeff, um conterrâneo de Gilles de Mirbeck, um francês apreciador da nossa música que abriu as portas da sua casa, em Achada Santo António, para receber a minha música, aquando da sua mais recente estadia entre nós.

Bila – é uma canção dedicada à Cidade de São Filipe (ilha do Fogo) e que surgiu de algumas observações minhas durante uma estadia de alguns dias. Curiosamente, apesar de ser a ilha dos meus pais, eu nunca tive oportunidade de lá passar muito tempo. Naquela ocasião, senti-me inspirado por coisas interessantes que vi e vivi naquela cidade.

Teatro di Rua –Em Setembro de 2005, altura em que estive em São Vicente a viver momentos mágicos no Mindelact, nas voltas obrigatórias pela Praça Nova, pude reparar num jovem chamado Nuno, mais conhecido por Girinóia, que andava na rua a pedir trocados. Bem, observei que ele agia como autêntico fingidor para poder convencer as pessoas a lhe dar algum dinheiro. Eu disse para mim mesmo: enquanto se faz teatro no Centro Cultural do Mindelo, na Praça Nova o Nuno está também a fazer o seu teatro, só que com a finalidade de sobrevivência. E isto tornou-se motivo para criar esta canção.

Serteza – esta procura, de forma mais neutra possível, fazer uma síntese da trajectória económica, cultural e política de Cabo Verde desde a Independência. Usei a palavra Serteza em sinal de evolução perante a Speransa, que havia sido usada por Norberto Tavares, há alguns anos.

Estas três juntam-se às outras quatro que já estavam na secção de links “Minhas Músicas”, situada do lado direito deste blog.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

CDs Com Alma

Que presentaço recebi no passado dia 30: Nhara Santiago, e das mãos do seu autor, o Nhonhô Hopffer! Ao ver e ler o Booklet (sério, de resto, por conter todos os elementos humanos e materiais complementares ao som constante no CD – letra das canções e seus respectivos autores, os artistas que participaram; os responsáveis pela parte técnica; os agradecimentos) e ao ouvir todas as músicas (Ai, como gostei do autocrítica do Nhelas Spencer e o Kor di Fodjada do Kaká Barbosa!), não tive dúvidas: é um CD com alma.

Aliás, devo confessar que esta ideia de CDs com alma viu-se reforçada em mim, ao ouvir a apreciação do Vadú sobre a cópia e a pirataria do seu novo CD: “És podi kopia Dixi Rubera, mas és ka ta kopia nha alma. (...)”

Temos assistido, cada vez mais, e com satisfação, à produção de álbuns (e o Nhara Santiago é um desses casos) em que os artistas têm cada vez mais liberdade nas escolhas e decisões sobre as músicas e os músicos que participam nele. Isto faz com que o produto final tenha a alma do protagonista ou protagonistas principais. Há vários casos, como o já referenciado álbum do Vadú (Dixi Rubera); o Badyo do Mário Lúcio; o Tras di Son do Djinho Barbosa; o Dança das Ilhas do Kim Alves e tantos outros.

Para concluir, penso que esses álbuns mereciam ser seguidos do livro que fala de todo o processo de sua produção, pois são uma teia de relações e de experiências com uma riqueza muito grande e que, portanto, deviam ser compartilhadas.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Futurologia Nº2: A Nossa Política

Na rubrica anterior, debrucei-me sobre o futuro da nossa música. Hoje é a vez da nossa política e dos nossos políticos:

ü Abstenção Eleitoral - As taxas de abstenções atingirão níveis record. Poderá até chegar o dia em que as Urnas serão móveis e correrão de zona em zona, cutelo em cutelo, rubera em rubera, à caça de eleitores, assim como chegou-se a fazer no Sudão.

ü Os Meios de Comunicação Social – a) o Telejornal da Televisão Nacional também baterá record, mas...de falta de audiência, sobretudo nos períodos eleitorais e de sessões na Assembleia Nacional; b) Os canais privados terão programas de humor sobre a política e os políticos nacionais e cada estação terá um apresentador âncora no Telejornal que não terá complacência e nem medo de criticar a sociedade política nacional; b) o Radar do “A Semana” dará lugar a um Caderno de Várias páginas com direito a caricaturas.

ü Juventude e Política - As crianças e adolescentes das nossas escolas primárias e secundárias não saberão ou terão grandes dificuldades em acertar o nome do Primeiro Ministro.

ü A Linguagem do Estado - A linguagem do Estado será mais económica e menos jurídica. Os partidos políticos serão infestados por economistas (protagonistas do Orçamento), e os juristas (protagonistas da Constituição e das Leis) estarão cada vez mais a trabalhar para privados, especializando-se na arte de meter o Estado na Justiça, por qualquer coisinha, para lhe arrancar bons quinhões.

ü Os Partidos Políticos - Os Partidos deixarão de ser decisivos para as nossas vidas e não teremos mais receio deles e nem dos seus dirigentes. Pelo contrário, nós estaremos a exigir que quando estiverem no poder apliquem bem os impostos que nós, e as empresas fruto do nosso espírito empreendedor, pagamos a duras penas.

ü Campanhas Eleitorais - Os comícios perderão muito da sua graça, pois não terão mais aqueles grandes nomes da “nossa” música em cima do palco. De qualquer maneira, estarão abarrotados, pois é uma oportunidade para divertir-se um pouco, tomar uns copos... . Muitos não vão sequer saber dizer quem subiu no palco para discursar.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

O Futuro da Música Feita pelos Cabo-Verdianos

Em 2008, uma rubrica que pretendo incluir na lista de labels do Djaroz é futurologia. Trata-se de um formato de tratamento dos temas que tentará provocar debates em relação ao que, daqui a alguns anos, teremos como sociedade, como cultura e como política.

Como não podia deixar de ser, o pontapé-de-saída é com a nossa música, ou melhor, a música feita por nós, pois não se trata somente de falar do futuro das nossos géneros musicais, mas sim das músicas que são feitas por cabo-verdianos, de uma forma global.

A minha reflexão resultou em 7 pontos:

1. A Lógica do Áudio-Visual - no futuro, não bastará somente ter somente talento musical. Ter uma cara linda ou um corpo escultural dará um grande jeito. A abertura de mais canais de televisão motivarão uma maior produção de videoclips que virão os seus custos reduzidos com os avanços tecnológicos.

2. A Reinvenção do Passado – Ao longos dos últimos anos, temos criado muitas canções. No futuro, os nossos arranjadores, com base nos seus conhecimentos mais aprofundados da harmonização e de composição, darão um rosto diferente aos nossos grandes sucessos. Provavelmente, poder-se-á ouvir uma gaita numa morna ou mais violinos introduzidos no funaná. (a versão Tito Paris do febri funaná de Codé di Dona é um sinal da viragem dos tempos).

3. Fusion & World Music Ltda – para o desagradado dos tradicionalistas conservadores, a nossa música para exportação vai ser isso mesmo: gente nossa misturada com gente de outras paragens para misturar estilos e cantar em crioulo, português, francês, inglês…..

4. Personalização de Estilos – no futuro, os músicos irão adaptar-se progressivamente à grande dificuldade de se unirem e vão se esforçar para, ao mesmo tempo, serem cantores, autores (fazem a letra das suas canções), compositores (criam melodias para as suas próprias letras), multi-instrumentistas (conseguem tocar vários instrumentos) e também produtores musicais (comandarão todo o arranjo da produção da sua própria música), com condições de arranjar músicas que dificilmente serão encaixados em algum estilo ou género convencionais. Haverá outros capazes até de serem produtores executivos e engenheiros de som do seu próprio CD!

5. A Música enquanto reflexo da Desigualdade Sócio-Económica – a linguagem da música electro-acustica será cada vez menos acessível à compreensão por parte da grande massa, em virtude da complexificação da harmonização e da estilização da linguagem na feitura das letras. A grande vantagem de tudo isto é que povão sentir-se-á desmotivado a piratear os CDs feitos nesse formato. A nossa classe mais abastada estará disposta a pagar o privilégio (ou o luxo) de assistir grandes espectáculos com estes tipos de artistas que, na sua maior parte, estarão mais fora do que dentro do país.

À grande massa restará a música electrónica que será a rainha absoluta dos táxis, hiaces, barbearias, salões de beleza, rádios, discotecas, comícios, festivais, etc.

6. Quota de Estilos Clássicos – haverá sempre essa preocupação de não deixar morrer os nossos géneros mais convencionais, havendo flutuações: um tempo é o batuco que reacende a chama, noutro é a morna, noutro a coladeira, o funaná, e assim por diante. Uma das medidas será o incentivo dado pelo Ministério da Cultura para quem incluir no seu CD canções feitas em versões clássicas desses géneros. Outra iniciativa deste mesmo Ministério será dar mais incentivos a rádios comerciais que passem, por exemplo, mornas durante certas horas... do dia!

7. Música na UNICV – Chegará o dia em que os Telejornais das várias televisões nacionais, públicas e privadas, mostrarão os recém formados em música da nossa Universidade a receber o seu diploma.

Se esse futuro é risonho ou não, cada um que tire as suas próprias conclusões.